terça-feira, 24 de setembro de 2013

UNCTAD recomenda o fim da agricultura industrial

Por: Francisco Roberto Caporal

O Relatório de 2013 da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Meio Ambiente (UNCTAD), divulgado dia 18 de setembro, recomenda aos países ricos e pobres que tratem de fazer mudanças profundas em sua agricultura, saindo dos sistemas de monocultivos para sistemas diversificados de produção. Recomenda, ainda, que se reduza o uso de fertilizantes e outros insumos. Sugere que seja dado mais apoio aos pequenos agricultores e que se atente para articular a produção e o consumo local de alimentos. E, afirma que o atual modelo agrícola hegemônico é insustentável.

Sob o título, Acordar antes que seja demasiado tarde: tornar a agricultura verdadeiramente sustentável agora para a segurança alimentar em um clima cambiante, o documento coloca a necessidade de mudanças profundas na agricultura, antes que as mudanças climáticas em curso comecem a trazer mais prejuízos.


Mais de 60 especialistas contribuíram para a elaboração do documento de 321 páginas e dezenas de artigos, no qual se adverte que o mundo precisa mudar o paradigma que orienta a forma de fazer agricultura, rompendo com o ideário da Revolução Verde e indo em direção a agriculturas ecológicas. Para os especialistas, as mudanças necessárias vão além de simplesmente fazer ajustes ao modelo de agricultura industrial de monocultivo, altamente dependente de insumos externos. É necessária uma compreensão holística, que vai desde antes da produção até o comercio, pois só assim será possível atacar o que o documento chama de “uma crise coletiva”, que se expressa pelos índices “constantes de pobreza”, pela “fome persistente”, pelo “crescimento das populações” e pelo aumento dos danos ambientais.

Neste sentido, entre as recomendações, se adverte para a necessidade de mudar os métodos convencionais de fazer agricultura, adotando uma visão sistêmica e métodos agroecológicos. Diminuir a distância entre produção e consumo, para reduzir o uso de matéria e energia, além do desperdício de alimentos que ocorre neste processo.

Segundo o documento, mais de um bilhão de pessoas passam fome e outros um bilhão estão subnutridos, ainda que a produção mundial atual seja suficiente para alimentar 12 a 14 bilhões, quer dizer, quase o dobro da população do planeta. Ao mesmo tempo, cerca de 40% das terras agrícolas estão sendo usadas para produzir matéria prima para ração animal.

A entidade da ONU adverte também que está em “gestação” uma nova crise, alimentada por vários elementos: o aumento constante dos preços dos alimentos, que em 2013 chegou a mais 80% em relação ao período 2003-2008. O crescente uso de fertilizantes químicos, que se multiplicou por 8 em 40 anos, enquanto a produção apenas duplicou. A redução nas taxas de crescimento da produtividade. Os “danos ambientais imparáveis”, com sérios impactos sobre o solo e a água, além da perda de biodiversidade. O fato de a agricultura ser o setor responsável pela maior emissão de gases de efeito estufa nos países do Sul global. (é o caso do Brasil). Por fim, alertam para o crescente compra de terras por estrangeiros, nos países do Sul.

Ainda, segundo o documento, o modelo hegemônico de produção de monocultivos e os métodos da agricultura industrial não estão conseguindo produzir os alimentos necessários a preços acessíveis e os danos ambientais deste modelo, além de crescerem permanentemente, são insustentáveis. Este modelo, afirmam, tem se especializado na produção para a exportação de produtos mais lucrativos, o que tem levado a cada vez maior escala de menores variedades de cultivos.

Para aqueles que militam no campo da Agroecologia, nada disso é novidade. A única novidade é que a ONU começa a tomar consciência do quão danoso tem sido o modelo de agricultura industrial que ela mesma ajudou a que se tornasse hegemônico. Danoso para o meio ambiente, danoso para as sociedades e danoso para as economias. Agora falta ver quais medidas serão tomadas, pois não basta reescrever o que já vem sendo escrito em muitos lugares e há bastante tempo, sem uma reação objetiva dos organismos internacionais e dos governos nacionais, transformando este ACORDAR, em políticas concretas de apoio à transição agroecológica.

Recife, 24 de setembro de 2013.


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